sexta-feira, 23 de junho de 2017

O Demônio no Telefone


Jussara estava na cozinha terminando de fazer o jantar distraidamente nos seus pensamentos tentando equilibrar pra não queimar algo, pois constantemente perdia o foco no que estava fazendo. Seu marido não ia demorar a chegar junto com seus dois filhos que pegaria da escola, já era inverno, mas esse final de tarde estava muito quente.

O telefone residencial tocou, seu marido queria desligar essa linha, pois não servia para nada, mas ela precisava para alguns serviços. Deixou o telefone tocar, se fosse importante ligariam para o seu celular. O arroz não estava cozinhando direito, então aumentou o fogo, a carne que estava fazendo também não estava cozinhando. Notou algo estranho no feijão, alguma coisa estava acontecendo dentro da panela de pressão, ela abre e algo estava se mexendo lá dentro, com uma colher mexe pra ver o que era, diversos besouros saem de dentro, no susto cai derrubando a panela no chão espalhando o feijão pelo chão.


Não demorou muito e o cheiro de queimado tomar conta da cozinha, o arroz tinha queimado totalmente. E não era apenas o cheiro, uma coisa podre parecia estar no ar, a carne dentro da panela estava totalmente podre com moscas em volta.

Jussara se levanta depois do susto, o telefone continua a tocar ininterruptamente, ela estava suando muito com o calor, mas a temperatura marcava 10° graus. Sentia alguma coisa no peito, como se algum tipo de fumaça dificultasse sua respiração, sentou-se à mesa ofegante. O barulho do telefone agora parecia ensurdecedor, resolveu então atender.



- Alô!

- Que bom que atendeu Jussara, minha filha!

- O que deseja?

- Você!

- Me desculpe, mas quem está falando?

- Aquele que trás o que você mais deseja.

- O que? Isso é algum tipo de brincadeira?


- Me escute filha! Eu te conheço, conheço suas angustias, seus desejos mais secretos, você não precisa esconder nada de mim, pois eu sei tudo.


- Eu vou desligar seu maluco.

- Não vai querer que seu marido descubra que os seus filhos não são dele, mas sim do melhor amigo dele. Eu posso ser o melhor dos aliados, mas também o pior inimigo que alguém possa ter.

- O que você quer de mim?

- Eu já disse, você!

Ficaram em silencio durante um tempo, Jussara confusa do que estava acontecendo.
- O que quer que eu faça?

- Diga pra mim, você não quer fazer aquela tão sonhada viagem para Europa? Não quer casar com o Giovanni? Finalmente se tornar uma atriz de sucesso com fama e dinheiro? – a voz que vinha do outro lado do telefone parecia a fazer se sentir eufórica e animada de um jeito bem diferente.

- Sim, eu quero, mas não posso. Tenho filhos e sou casada agora.

- Porque isso é um problema?

- Não posso me livrar deles assim simplesmente, as coisas tem consequências.

- E se eu lhe disser que posso me livrar de tudo, tudo o que você fizer ninguém ficará sabendo, e você ainda conseguirá tudo o que deseja.

- Como?

- Faça o que eu lhe disser, vamos fazer um pacto. Diga apenas que servirá a mim para todo o sempre, e você será uma atriz famosa morando na Europa com o amor da sua vida.

- Eu lhe servirei para todo o sempre!

- Agora pegue essa faca e espere seu marido e filhos.

A porta se abre com a chegada deles, e são surpreendidos por Jussara.


segunda-feira, 19 de junho de 2017

Lendas Urbanas - A Loira do Banheiro



É uma história complicada, mas é uma das lendas bem antigas que fazem parte da vida de qualquer estudante. Essa lenda é muito conhecida, qualquer em já deve ter ouvido falar nela nos corredores de uma escola. Ela é muito comentada, mas também incerta, existem muitas versões para ela.

A lenda conta que uma menina loira muito bonita vivia matando aula na escola, ficando dentro do banheiro, fumando, fazendo hora. Então um dia, durante essas escapadas, ela caiu, bateu com a cabeça e morreu. Desde esse dia, os banheiros de escolas são assombrados pelo espírito de uma loira que aparece quando se entra sozinho.



Outra origem diz ser Maria Augusta de Oliveira: A loira do banheiro é na verdade o fantasma de uma pessoa real chamada Maria Augusta de Oliveira. Essa é a sua história:

Filha de Francisco de Assis de Oliveira Borges, Visconde de Guaratingetá e de sua segunda esposa, Amélia Augusta Cazal, Maria Augusta nasceu no ano de 1866 e teve uma infância privilegiada e um requintado estudo em sua casa, cujas terras ultrapassavam os limites da atual Rua São Francisco.


Sua beleza encantava os ilustres visitantes que passavam pelo vale do Paraíba. Foi obrigada a se casar com apenas 14 anos com um homem mais velho, morreu na Europa depois de fugir dele aos 26 anos.

Diz a história, que um espelho se quebrou na casa de seus pais em Guaratinguetá no mesmo momento em que Maria Augusta morreu.Seu atestado de óbito desapareceu com os primeiro livro do cemitério dos Passos de Guaratinguetá, levando consigo a verdade sobre a morte de Maria Augusta.
Para o transporte do seu corpo ao Brasil, focam guardados dentro de seu tórax as jóias que restaram e pequenos pertences de valor, e foi colocado algodão em seu corpo para evitar os resíduos.

Quando o corpo da filha chegou ao palacete da família, sua mãe o colocou em um dos quartos para visitação pública e assim ficou por algumas semanas durante a constução da capela.
O corpo da menina, que estava em uma urna de vidro, não sofria com o tempo e ela sempre aparentava estar apenas dormindo.

Depois a mãe negou-se a sepultar o corpo da filha devido a seu arrependimento, mesmo quando a capela ficou pronta. Até que um dia, após muitos sonhos com a filha morta, pedido para ser enterrada e dizendo que não era uma santa ou coisa parecida para ficar sendo exposta, e da insistência da família, a mãe consentiu em sepultá-la.

Suas conhecidas aparições nos banheiros são por conta da sede que seu espírito sente por ter sido colocado algodão em suas narinas e boca.

Como Evocar?
Primeiramente, como o próprio nome diz, pra começar você tem de ir para um.... banheiro de escola, e fazer uma dessas coisas para a loira aparecer:

- chutar 3 vezes a porta do banheiro
- dar descarga 3 vezes seguidas em qualquer privada
- ir para a última porta do banheiro e dar 3 descargas seguidas (era assim na minha escola)
- Entrar em uma cabine, trancar a porta, sentar na privada e dar 3 descargas.
- Bater a porta 3 vezes, dar descarga 3 vezes, abrir e fechar a torneira 3 vezes e falar 3 palavrões.

sexta-feira, 16 de junho de 2017

Um escritor, um pacto falhado - Parte 2

  Escrito por James Nungo & Bruno Costa


Aquilo já não era Vânia, senti e vi que algo tinha possuído o corpo dela como ela dissera.

A escuridão me restringia de ver completamente a sua face mulata, que agora já não respondia pelo mesmo nome.

- QUAL É O TEU INTENTO? - ela disse com uma voz grotesca, uma voz dos infernos, ainda pairando na escuridão.

Eu não sabia o que dizer, nunca tinha feito algo parecido, o meu corpo herdava arrepios contínuos, a primeira palavra sufocou minha garganta.

Olhei para o meu braço chocolate e percebi que estava tremendo muito. Segurei a urina na bexiga, para não escorrer por entre as pernas.

Mas eu tinha que dizer algo! Seria um grande poeta! Juntei e colei os pedaços da minha coragem.

- Eu... - senti algo ruim se contorcendo no meu ser.

- Eu quero ser um grande poeta em todo mundo, quero que os meus versos tragam inspiração para todos que ouvirem. - disse com a voz trémula, porém o importante é como eu disse.

- SOU ZAMBOIO, FAÇO QUALQUER COISA QUE QUALQUER UM QUER, OS MEUS ACORDOS NÃO TÊM VOLTA, HA, HA, HA...
As suas falas eram descontroladas.

- O TEU DESEJO VAI SE CONCRETIZAR LOGO QUE TU SAIR DAQUI.

- E o que tenho que fazer?

Os olhos da entidade mudaram de cor. E escritas apareceram no meu peito, me queimando por escassos segundos.

- TU TENS QUE ASSINAR TODAS AS SUAS POESIAS COM AS PALAVRAS QUE ESTÃO CRAVADAS NO TEU PEITO - Zamboio disse.

Aquilo estava acontecendo ou era a minha imaginação? Lembrei dos velhos tempos, quando eu era professor de filosofia, nunca acreditaria em um demônio, mesmo estando perante minha visão. Se alguém apenas me contasse, teria crise de risos.

- Obrigado... Zamboio.

- AINDA NÃO TERMINEI, PORTANTO NÃO AGRADEÇA.

- O que falta?

- TU SABE QUE NEM TODOS OS ACORDOS SÃO FÁCEIS DE CUMPRIR, HA, HA, HA. EU SOU MUITO GENEROSO, POR ESSA RAZÃO, SOU MUITO ADORADO POR TODO O MUNDO... QUERO UMA ALMA EM TROCA!



- Uma o quê?

- NÃO ME FAÇA REPETIR!!! - a criatura gritou, ainda pairando no meio da grande torre. A escuridão intensa já se fragmentava, como se fosse um sinal do fim do nosso acordo.

- Tá bom - disse, mas não estava nada bom. Porém fiquei calmo quando a imagem de Joaquim voltou na minha mente. Era ele que eu sacrificaria, seria parte do pacto.

Minhas pálpebras cobriram meus olhos castanhos por um segundo, quando a Vânia caiu nas cinzas, dentro da cova e sem sentidos.
Arrastei ela para fora.

- Vânia, Vânia - sacudi ela pelos ombros.

- Oi, senhor poeta - ela disse com a voz fraca, como se acordasse de um sono.

Em seguida apagou, no entanto o seu coração pulsava, ela estava viva, isso me acalmou.

Carreguei-a pondo nas minhas costas como se estivesse carregando uma criança.
Levei-a até em casa, já eram 5:07 da manhã. No meio do caminho planejava argumentos que usaria caso encontrasse vó Joana acordada.Tive muita sorte, pois ela não estava em casa quando cheguei. Imaginei ela indo na casa do meu irmão, Osvaldo.

Coloquei Vânia na cama do meu quarto. Pus água para esquentar. Levei um pano e uma bacia. Pus a água da chaleira para bacia e comecei a molhar a testa dela.Uma pergunta invadia o meu cérebro, "será que deu tudo certo?"

Saí do quarto. Ainda curioso, resolvi telefonar para saber da vó Joana.
Peguei o telefone que se encontrava na mesa da sala e liguei no número do Osvaldo.

- Alô?

- Oi, quem fala?

           - Sou eu irmão, liguei para saber se avó Joana está aí. Quando cheguei, não a encontrei. Ela está aí? - eu disse colocando o telefone entre o ombro e orelha para poder deixar as mãos livres.

- Sim ela está aqui e vai passar uma semana aqui. Afinal ela não te disse nada quando saiu?

- Não - disse tirando um cigarro do bolso - Mas... Tá bem! Manda um olá para ela.

- Farei isso logo que ela voltar.

- Voltar?

- Sim. Ela saiu e foi passear um pouco, você sabe o quanto ela gosta de passear, até exagera, às vezes. Ela diz que se senti jovem quando passeia, ha, ha, ha...

- É verdade, ha, ha, ha. Tchau, falamos outra hora.

- Tchau.

Desliguei o telefone, pus o cigarro na boca, acendi e comecei a inalar o fumo, estando na sala. Se avó Joana estivesse em casa, eu não faria isso, sorte minha por não está. Fui para o quarto, verifiquei se Vânia estava com os olhos fechados ou se já tinha se recuperado. Continuei a fumar, depois fui até a minha gaveta, levei o cinzeiro e coloquei o cigarro que estava pela metade.
Começou a surgir a ideia de levá-la até um hospital, pois antes do ritual ela não tinha me dito que ficaria nesse estado.Levei a cadeira que estava por trás da porta, coloquei ao lado da cama e vi os músculos da face dela começarem a se movimentar, o meu coração perdeu o peso que eu sentia.Peguei a mão dela.

- Vânia? Tá tudo bem? acorda, conseguimos realizar o ritual com sucesso.
Ela abriu os olhos de um modo lento e apertou minha mão.


- Estou bem. Acho que estou bem, apenas doe a cabeça - ela disse levantando a coluna e sentando.

Ela olhou-me com um olhar demorado.

- Vou ver se tem paracetamol na gaveta.

Levantei, fui até a gaveta, vasculhei durante um minuto, pois aquilo estava desorganizado, tendo uma mistura de cigarros, folhas cheias de versos inúteis, que eu já não precisava mais usar, meu velho dicionário e outras coisas.
Por fim encontrei, saí do quarto fui até cozinha buscar água, voltei ao quarto e dei-a para tomar, após isso ela me questionou.

- Como foi o pacto com Zamboio?

Sentei na cadeira ao lado da cama, introduzi minha mão no bolso e tirei mais um cigarro. Acho que ela sentiu que eu estava a demorar para responder e isso talvez a fazia pensar que o acordo com Zamboio não dera certo.

- Como foi o acordo com o Zamboio? - Insistiu.


Como resposta abri a minha camisa ao meio e ela assustou-se quando viu as escritas cravadas no meu peito. Logo, expliquei tudo que aconteceu.

- E agora? - Vânia me fitou com os olhos arregalados.

- Preciso testar. Vou voltar para a Casa da Hiena, hoje mesmo. - Toquei na mão dela. - Vem comigo?

- O que pretende? 

- O Zamboio não fez questão de me explicar. Como consigo uma alma para ele?

- Ele não é fresco, como outras entidades. É só cometer assassinato e oferecer essa ação para ele. Como uma oração de sangue.

- Entendi. Então, vem comigo?

- Vou. Mas você não me respondeu. O que pretende?

- Vou mandar o Joaquim pro inferno.

Vânia me abraçou forte. Sem nenhuma palavra, ficamos colados por alguns minutos. Um silêncio cheio de pensamentos barulhentos. Ela ficou comigo até a noite cair sobre Orge. Os boêmios saíram de seus buracos e já andavam pelas ruas. Escrevi uma poesia nova na calada da noite. Os versos escorregavam na folha como lodo e inflamavam como gasolina. Quando terminei, assinei com o meu pseudônimo satânico marcado no peito. Eu e Vânia saímos da casa e fomos direto para a Casa da Hiena.

               No caminho, vi uma silhueta no topo da antiga torre. Talvez duas, não sei. Poderiam ser qualquer coisa ou só minha imaginação projetando lembranças recém cravejadas no meu cérebro. Nós entramos na espelunca, passamos entre as mesas e eu senti o peso de alguns olhares me seguindo. Sentamos e acenei para o garçom.


- Vai querer o quê? - disse, quando encostou na mesa. 

- Traz uma dose de cachaça. - Me virei para Vânia. - E você? Pode pedir!

- Me traz o mesmo do dele - ela disse ao garçom.

Logo, o sujeito se foi.
No velho palco de madeira, uma mulher volumosa cantava uma música local. Ela tinha uma voz sexy. Comecei a curtir aquele som. Acendi um cigarro. Olhei pra Vânia. Ela parecia uma estátua, deveria estar preocupada. 
As doses chegaram, matei a bebida de primeira, me sentia ansioso. Pedi uma garrafa inteira de veneno, antes do garçom sair. Vânia começou a passar o dedo em volta do copo ainda cheio.

- Não quer beber? - perguntei.

- Acho melhor sairmos daqui.

Nesse instante. O Joaquim entrou com mais dois amigos dele. Os três me fitaram e foram sentar em uma mesa afastada da nossa. Sorri para a Vânia.

- A festa começa agora.

Depois que a mulher saiu do palco, me levantei e fui até lá. Subi, dei os meus tapinhas no microfone. Olhei em volta. Puxei minha blusa de botão para o lado. Estourei todos os botões e minha marca ficou visível. Vi o assombro se espalhando no semblante de todos. A atenção dos vagabundos era minha. Puxei meus versos e comecei:



Santa foice
Que colhe as almas
Te pego na mão
E colho destruição
A dor aumenta
Os olhos se apagam
A dor aumenta
O corpo treme
A DOR AUMENTA!
A alma grita
Que alma?
Alma vagabunda
Esdruxula
Agorenta
TE MATO 
Desgraçado
É seu fim
JOAQUIM.

A minha oferenda se levantou e correu até mim. Fiquei parado com um sorriso largo no rosto. Ele vinha como um leoa faminta. Mas ali, ele era a caça. Um petisco para dar sabor no inferno. O rosto dele se contorcia de raiva.
Raiva?

Quando subiu no palco, ele se ajoelhou e pôs a mão no peito. Abaixou a cabeça e vi gotas pingarem no assoalho. Joaquim me encarou. As gotas eram lágrimas. Não era raiva. 
Era dor.

- Que... merda... você fez? - As palavras eram cortadas pela respiração rápida.
Olhei para as pessoas. Vi seus corpos rolarem pelo chão, ouvi gritos, garrafas se estilhaçando no chão. Choro, berros e agonia muda. Vi Vânia chorando e puxando os cabelos. Comecei a me tremer. 

O que eu fiz? O que eu fiz? O que fiz?

Tenho que desfazer isso. Fui até minha amiga. Segurei e arrastei ela para fora daquele pandemônio. Vânia se debatia, me esmurrava e gritava.

- Está doendo! Dói! Não toca em mim! 

Com esforço, puxei ela até a Torre de Orge. Quando chegamos, Vânia desabou no chão. Olhei para aquele caixão de ferro, no topo.

- Zamboio! Filho da Puta! Aparece desgraçado! 

Droga! Como vou falar com ele? Tenho que acertar esse acordo! Ele me enganou! Escutei o rangido dos ferros. Ergui a cabeça e vi aquelas sombras de antes. Algo pulou lá do alto. Escutei uma pancada amortecida na terra, soando atrás de mim. Virei-me assustado. 

- Avó?

- OI, NETINHO VAGUNDO! - Aqueles olhos amarelos faiscavam. Aquela voz gutural me massacrava. 

- O que... Sai do corpo da minha avó, porra!

- OUSA ME DAR ORDENS?! HÁ, HÁ, HÁ!!! SUA VELHA ESTÁ PASSEANDO NO INFERNO, SE ELA VOLTAR, ELA FICARÁ MAIS JOVEM. MAS SE NÃO VOLTAR, FICO COM ESSE CORPO PARA PASSEAR NA TERRA.

         Quando procurei um demônio para resolver um problema, eu ganhei mais um e encontrei outro. Aquilo fugia do meu controle. Afinal, quando eu estive no controle? A Vânia estava no chão, olhos abertos e saliva escorrendo da boca. Minha avó Joana se vendeu para o Zamboio. Por juventude, a alma dela se arriscava no inferno.

O que me restou?

Versos que matam. Um pseudônimo no peito. E sofrimento.
Tentei salvar as mulheres da minha vida inútil. Mas Zamboio as levou. Peguei um graveto do chão e escrevi minha marca aos pés da Torre de Orge:
P E S A D E L O

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Lendas Urbanas - O Diabo da Garrafa



O Diabo da Garrafa, conhecido como Famaliá, Cramulhão, ou capeta da garrafa, é um pequeno demônio que nasce de um ovo, e é criado por um humano, normalmente que tenha pacto com o diabo, para satisfazer seus desejos materialistas. É uma lenda que veio para o Brasil herança do folclore Português. Na Bahia desde 1591 ouve-se falar dessa lenda. 

A lenda era predominante em Portugal, e sua fama chegou logo depois ao Brasil, pelos rituais de São Cipriano encontrados no seu Livro de Capa Preta.

O pacto consiste, na maioria das vezes, em uma troca, a pessoa pede riqueza em troca sua alma fica pertencendo ao diabo. Primeiramente a pessoa deve se render totalmente ao diabo, escrevendo em uma folha virgem com seu próprio sangue: “Eu, com o meu próprio sangue do meu dedo mínimo, faço escritura a Lúcifer, imperador do inferno, para que ele me faça tudo quanto eu desejar nesta vida, e, se isto me falhar, lhe deixarei de pertencer”.
Após isso, deve se fazer o mesmo texto em um ovo de uma galinha preta que tenha cruzado com um galo também preto, depois, pingar uma gota do dedo mindinho dentro do ovo e colocá-lo para chocar em baixo de um monte de estrume, ou para que a galinha preta o choque.

  No fim de 40 dias aproximadamente, o ovo é chocado e nascerá o diabinho, de 15 cm à aproximadamente 20 cm, mas não se trata de um simples ovo de galinha, e sim um ovo especial, fecundado pelo próprio diabo.  

Em posse do diabinho, a pessoa coloca-o logo numa garrafa e a fecha. O Cramulhão deve ser alimentado todo sábado, para isso, deve se por o dedo mindinho na boquinha da garrafa, ou em um pequeno buraco feito na caixa, para que ele possa beber sangue, assim realizando os desejos, quem consegue ter o diabinho assim, consegue tudo o que desejou na vida, assim como a riqueza irá aumentando até o final da vida, e no final da vida leva a sua alma para o inferno.


sexta-feira, 9 de junho de 2017

Um escritor, um pacto falhado

Escrito por James Nungo & Bruno Costa


  Escrever era uma merda. 
            Fui mal interpretado por muitos, até pelos piores ouvintes. Bêbados, prostitutas e artistas da casa. Desmotivado, rasguei vários rascunhos que eu considerava bons. Poesia? Eu dizia que sim, aquilo era poesia. Recitava na casa noturna mais podre de Orge. Iluminação precária, moscas e cheiro de vómito eram as marcas da Casa da Hiena.

Subi no palco de madeira e dei uns tampinhas no microfone. Tirei o papel amassado do bolso. Coloquei meus olhos embaçados nos versos. Alguns drogados cambaleavam até o balcão e o ventilador do teto espalhava poeira. Comecei:

- No lixo
Na dor
Na merda
E no cu!
Cuspo
Letras
No papel higiênico...

- Vai te foder, parceiro! - um homem gritou e jogou um copo de cerveja em mim.

Esquivei do copo, mas a cerveja molhou minha calça e os versos. Desci do palco, marchei até a mesa do sujeito atrevido. Acertei um soco na cara dele. Ele rolou da cadeira pro chão. Cuspi no desgraçado.
Ele gargalhou com sangue na boca.

- Se manda daqui. Tua ladainha não cola. Só tu que faz poesia com a bunda e acha bonito - Ele lançou um olhar por cima dos meus ombros.
Me virei. Vi cinco homens de pé. Me encaravam sem vacilar. Um deles puxou uma faca do cinto. Fui recuando com cautela. Eles avançaram e ajudaram o companheiro a se erguer do chão. Saí dali.

Puxei o cigarro do bolso da camisa e acendi, andando pela madrugada. No centro, as ruas estavam vazias. O vento batia no meu rosto. A fumaça entrava pelo nariz. Fiquei olhando para atrás o tempo todo. Ninguém me seguiu.

Vi um mendigo deitado na calçada, do lado, uma garrafa de cachaça estava pela metade. Peguei e continuei andando. Bebi no gargalo, empurrei tudo e as lágrimas escorreram pelo meu rosto. Estava puto. Porque eles não gostavam das minhas linhas? Quem eles pensam que são? Esses porcos mal sabem assinar o próprio nome.



Passei pela Torre de Orge, aquilo sempre me lembrava um caixão imenso pronto para ser queimado. O ferro estava corroído e fedia a mijo. Era alta, e diziam que ela já estava aqui, antes da cidade ser construída.

Mas quem faria uma torre no meio da África, sem nada em volta? Comecei a pensar na morte e a torre se tornou mais atraente.

Continuei com passos desequilibrados até chegar na casa da vó Joana.

- Tavares! Isso é hora de você chegar?! - Minha velha apareceu no portão.
- Desculpa vó... eu... bebi e... um filho da...

   Apaguei.
               Só me lembro da ressaca massacrando minha cabeça no dia seguinte. Ouvi batidas na porta do meu quarto e levantei da rede. Fiquei imaginado como fui parar lá. Abri a porta. E tive uma surpresa, era a Vânia.
Ela me enfiou um tapa na cara. Recuei um passo. Coloquei a mão no rosto, incrédulo.


- Tu é louco?! Esmurrar o Joaquim daquele jeito... Sim! Já estou sabendo. Você tem sorte dele não ter te matado.

- Que horas são? - A claridade machucava a minha visão.

- Tu está me ouvindo?! - Ela pôs as mãos na cintura. - Me diz o que aconteceu!

- Você já sabe.

- Quero ouvir da sua boca. Anda, fala logo!

Fui me sentar na rede. Ela se escorou na parede.

- Estou cansado. Não consigo emprego. Gosto de escrever e recitar. Ninguém quer ler minhas poesias. Coloquei algumas na internet, ninguém vê e si vê, não comenta. Como posso continuar com isso?

- E socar os outros vai ajudar em quê?

- O filho da puta jogou um copo em mim! - Me levantei da rede e comecei a andar pelo quarto. - Era pra eu beijar ele? Não quero saber dele! Eu preciso de leitores, de motivação!

- Tavares, me escuta! - Parei e encarei ela. - Talvez, eu possa te ajudar. - ela colocou as mãos nos meus ombros.

- Como?

- Eu já morei em Khedie, lembra? Aprendi alguns costumes de lá...

- Você tá pensando em...

- Sim, é isso mesmo.

- Não sei, não entendo muito disso.

- Eu te ajudo.



Khedie era uma cidade conhecida pelo uso exagerado da magia negra. Os moradores de lá faziam feriados em homenagem ao Zamboio e outras entidades macabras. Realizam cultos sangrentos, utilizando de sacrifícios e pactos. Pensei no assunto, se aquilo desse certo, eu poderia ser um grande poeta.
- Tudo bem. Vou fazer um pacto. Mas como se faz isso?

- Me encontra as três da madrugada, lá na torre. Eu levo tudo e preparo lá mesmo.

Fiquei ansioso até dar o horário. Cheguei no local com dez minutos de antecedência e a Vânia já estava lá, cercada pelas quatro pernas de ferro. Me abaixei e passei entre os apoios. No chão de terra havia um buraco.

- Você disse três horas. - Olhei meu relógio de pulso.

- Vim antes para preparar o terreno.

Me aproximei e vi o que tinha no buraco. Cacos de vidro, papel rasgado, ossos e penas. Ao lado, na terra batida, um livro de capa preta descansava no chão.

- Pra que serve isso?

- Escolhi o Zamboio para o acordo. Ele é melhor, usei fetiches de acordo com o gosto da entidade. Ele prefere restos de animais e material inútil. Você trouxe as suas poesias? Elas podem servir - Ela sorriu.

- Isso não tem graça.

Vânia puxou uma garrafa da mochila, que trazia nas costas. Despejou um líquido nos fetiches. O cheiro de gasolina subiu. Depois puxou uma faca, cortou uma mecha do cabelo enrolado e jogou na cova.

- Escuta. Quando eu queimar isso aqui, vou entoar um cântico e o Zamboio vai usar meu corpo. Então, é só você falar com ele.

- Espera! Falar o que?

- O que você quer. Faz um acordo, mas não barganha muito, não. Ele é louco.

- E o que ele vai pedir?

- Isso, eu não sei. Geralmente ele cobra de acordo com o pedido.

- Certo, então queima logo isso.

- Calma, vê aí que horas são.

- três e dez - disse consultando o relógio.

- Vou queimar às três e quinze.

- Enquanto isso, eu fumo.



Acendi um. Os minutos passaram com baforadas de fumaça. Olhei as horas e quando tive a confirmação de Vânia. Entreguei o cigarro, e ela o jogou nas oferendas. A fogueira subiu, ela resmungou um gemido crescente. Com o livro na mão, começou a entoar o cântico, palavras incomuns ela pronunciava. Um arrepio gelou minha alma. Os braços dela dançavam e ela requebrava o quadril largo, com os olhos fechados.

Durante aquela ação, o céu ganhou um tom negro abissal, engolindo a lua que pairava serena. A torre rangeu baixinho. Aquele conjunto de acontecimentos além de me trazer mais arrepios, me inundava com uma sensação excêntrica.

Soou um assobio proveniente do vento. Era um vento circular, arrastando papeis e levantando poeira, pensei em sair dali, no entanto a minha gana de se tornar um grande poeta não me deixou fazer isso.

Vânia começou a flutuar, abriu os olhos completamente diferentes, no meio da torre. Olhei e vi que eram amarelos, um amarelo carregado, faiscando na escuridão.

Ela deixou cair o livro, parou de pronunciar palavras incomuns e seus olhos viraram na minha direção.

Continua...